segunda-feira, 13 de abril de 2015

Como vou respeitar meu filho

Filho, está na hora do almoço. Do alto de seus três anos de idade, ele olha pra mim e diz, sem perder o foco do que está fazendo – “Non, non, non. Muito obidado”. Ele é um garotinho cheio de atitude. Me encantam as posições firmes e decididas do meu pequeno. Ao chegar de um passeio ou ao retornar da igreja pra casa, paro o carro e a mãe diz “Chegamos!”, ao que ele responde prontamente: “Non quéio chegamos”.
A tenacidade aumenta proporcionalmente ao aumento do vocabulário. Agora, quando quer algo ele diz, “Pai, eu quero muuiiiiiiito”, com toda esta ênfase, e termina a frase com um “por favor” tão suplicante que fica difícil resistir. Quando o filho diz apenas um “vamos jogar bola”, assim num tom mais imperativo do que convidativo, talvez seja mais fácil para um pai apaixonado dizer um “agora não”. Mas quando ele usa de uma estratégia doce, (que eu não sei onde aprendeu) e diz “Papai, você pode jogar bola comigo, por favor?” é bem mais difícil recusar... E esta frase ele diz assim mesmo, com a correta pronúncia de todas as palavras, e isto dito em sua voz infantil, adquire um tom de carência com enorme poder de convencimento.
Outro dia, ele pediu várias vezes para passear. Dissemos a ele que não era o momento, e que depois iríamos. Mas ele não se deu por vencido. Pediu, e usou o recurso do “eu quero muiiiiito”. Não funcionou. De cabeça baixa, ele usou o “por favor”. Também não deu. Alguns minutos depois ele disse assim: “Papai, quéio fazê Papai do céu.” Meio que admirado e feliz, respondi que sim, e que bom que ele queria orar. Me ajoelhei com ele, perto da mãe e de alguns amigos. E ele orou assim:
- Papai do Céu, eu quero passear. Amééém!
Tive que reconhecer que meu pequeno sabe a quem pedir as coisas. Percebi também que ele já está dominando a arte do “como pedir” e do “momento certo”. Não me pareceu, em nenhum momento, uma chantagem, mas sim a perseverança de um garotinho que deseja algo muito, e que ainda não conhecendo nada sobre conveniência e convenções sociais, luta por aquilo que quer.
As posições firmes de meu filho e suas vontades e desejos perseguidos com afinco foram gatilhos que me fizeram pensar na enorme responsabilidade que tenho, enquanto pai, educador e amigo, de respeitar meu filho e seu jeito de ser. As decisões dele não são as que eu tomaria. A forma como ele sente o mundo é diferente da minha, e o gosto que ele tem por algumas coisas e por algumas atividades não são sempre os mesmos que eu tenho. E justamente por causa destas diferenças devo respeitá-lo para não sufocar sua identidade. Preciso ensinar a ele limites, coerência, caminhos, ética... Mas preciso fazer isso respeitando a pessoa única e determinada que ele é. Então, me veio à mente a pergunta crucial: Como vou respeitar meu filho? Procurei pensar numa resposta ampla, profunda e verdadeira, buscando em Deus sabedoria para esta missão. Como é minha proposta pensar em questões como esta DE UMA OUTRA FORMA, quero dividir com vocês o que consegui construir em dez pontos-chave. Vamos lá?

1.      O primeiro ponto é entender, ainda que minimamente, a palavra respeito. De forma geral, por definição, respeitar é tratar uma pessoa com reverência ou acatamento, e mesmo honrar o que ela é, representa ou faz. Quanto respeitamos, damos atenção ou importância, consideramos o outro. Também por definição, entendemos o ato de respeitar como não agir contrariamente a uma decisão, orientação ou regra que são, ou estabelecidas pela cultura, ou pelos outros dentro de seus direitos, ou ainda negociadas e acordadas entre partes. Respeitar, portanto, é acatar, e por isso, agir de modo que nossa ação não fira e não magoe alguém ou destrua alguma coisa. Ter respeito (e oferecer respeito) é admitir o valor. É bem diferente de tolerância, de suportar os desmandos e descasos intencionais de outros, mas de entender que eles têm direito e espaço para tomar decisões pessoais, mesmo que consideremos que estejam errados ou em desacordo com nosso entendimento do que é correto, e que entendamos que sofrerão consequências. Isso não nos impede de admoestar, de alertar e de até mesmo coibir e punir, quando dentro de nossas possibilidades e entendido como nossa responsabilidade de oferecer proteção e correção (no caso dos pais e tutores). Isso porque respeito tem ligação com fidelidade e compreende as noções de confiança e de agir honestamente. Também tem ligação com relevância e com a consideração. A etimologia sugere, em sua raiz vinda do Latim, a ideia de que uma pessoa merece um segundo olhar ou tem qualidades que devem nos levar a uma atitude de consideração e reverência. É assim que desejo respeitar meu filho.

2.       Respeitar como parte de mim. Todos merecem respeito, e quanto mais aquele que é mais passível de ser magoado por minhas ações por ter uma ligação tão próxima comigo. Entendo que numa relação pai e filho, o respeito ao filho é uma extensão de meu respeito próprio. A afirmação de meu valor, com estima equilibrada, a compreensão de minha importância como pessoa, a busca honesta da realização de meus sonhos e a correta visão de meus direitos e deveres e, por fim, a crença sincera de que sou amado por Deus e por minha família me capacitam a respeitar meu filho como a pessoa completa que ele é. Assim como não gosto de ser ferido, contrariado, magoado ou desconsiderado, não farei isso a ele. Ainda mais quando os motivos forem tão pequenos, como um brinquedo esquecido no chão da sala ou um pouco de suco derramado no sofá. Em função da ligação forte entre nós, seguir a regra de ouro é essencial: respeito meu filho como gostaria de ser respeitado. Como ele é parte de mim, se não o respeito também sofro, em mim mesmo, o desrespeito que ele sofre.

3.       Ritmo e Resignação são dois aspectos muito importantes para que meu filho seja respeitado devidamente. Independentemente de ser criança, meu filho tem (e sempre terá) seu ritmo próprio para aprender e agir. Um de meus maiores desafios enquanto pai é o de andar no mesmo passo enquanto estiver ensinando. Ele às vezes vai depressa demais, e eu quase não consigo acompanhar seu ritmo alucinante quando brinca, conversa, interage e se desenvolve. Outras vezes as coisas me parecem lentas demais, e sou tentado a “empurrar” meu menino em um aspecto ou outro (o que acaba sendo frustrante para ele e para mim...). O melhor que posso fazer é estar resignado quanto a isso. Resignação não é acomodação ou desistência, mas um tipo especial de paciência que devemos desenvolver e que se aplica na espera, com calma, diante das dificuldades e na aceitação, com dignidade, das impossibilidades. Quando olho para meu filho brincando do seu jeito (tão diferente do meu), aceito com resignação seu ritmo e seu estilo, e passo a entender que amo meu filho (o que ele é) muito mais do que meus sonhos de como ele deveria ser. Isso, conforme entendo, é respeito.

4.       Entender bem os limites e o espaço é um ponto diretamente ligado ao fato que acabamos de discutir sobre o ritmo, porque tem ligação com a potencialidade e individualidade de meu filho. Quando falo de limites, me refiro não só a colocarmos termos para o que pode ou não pode ser feito, mas também aos limites impostos a ele por sua compreensão e maturidade, limites estes que devem ser ampliados constantemente, tanto de forma natural como através de estímulos e investimento dos pais no desenvolvimento das crianças. Em função destas limitações da maturidade, não estou verdadeiramente respeitando meu pequeno se lhe imponho um castigo por coisas que ele ainda não compreende, que estão fora de suas concepções de bem-estar, de decoro e de sociabilidade. Como posso me zangar e me frustrar com um almoço demorado e comida espalhada em volta do prato, da mesa e em suas roupas, quando ele ainda está lutando para obter uma coordenação motora que levei anos para desenvolver e ainda não domino perfeitamente em muitas ocasiões? Não há respeito de minha parte em descarregar minha frustração e raiva por brinquedos espalhados e eventuais paredes riscadas, pois afinal de contas, meu filho é uma criança! Não posso castigar uma criança por ser criança. São limites (diferentes daqueles que impomos pela segurança e pela conveniência social e boa convivência) que meu filho ainda não consegue vencer. Entender isso (e esperar que ele amplie seu domínio) é respeitar. E isso envolve o espaço que ele ocupa, seus locais de exploração e de vivência. É neste espaço que ele experimenta as sensações, que ele treina sua movimentação e onde tem o direito de errar, quebrar, retornar e se acomodar. Meu filho precisa de espaço para ter seus pertences, suas coisas e praticar suas ações (como criança ou como adulto). É neste seu lugarzinho no mundo (que pertence a ele), que pode ser representado por um quarto, um cantinho da casa ou um baú de brinquedos, que os limites de compreensão e maturidade são ampliados, e aqueles outros limites, os de segurança e comportamento são estabelecidos. Pisar neste espaço com cuidado, como convidados e não como invasores, é um ato de respeito que todos os pais devem cultivar.

5.       Sentimentos e sensações são, indiscutivelmente, um ponto onde o respeito deve ser efetivo. Todos temos o direito de gostar e não gostar. No que diz respeito às pessoas, embora o imperativo do amor seja essencial para uma vida plena de significado e de ligação com Deus, meu filho precisa aprender isso através de exemplos e com o tempo. Não o estou respeitando quando peço que ele demonstre apreciação forçada por alguém que o deixa desconfortável naquele momento (ainda que seja um tio querido ou a vovó) ou quando exijo que passe tempo ou interaja com meus amigos como se fossem os amigos dele. Da mesma forma não demonstro respeito quando faço críticas à sua tristeza ou decepção por “coisas pequenas demais” ou quando desaprovo seu apego ou estima a um colega de escola ou a uma professora querida. Ele deve poder expressar e direcionar seus sentimentos com liberdade. Assim como deve ter liberdade para vivenciar suas sensações negativas de medo, insegurança e desconfiança tanto como esperamos que ele vivencie as boas sensações de prazer, realização e entrega.

6.       Considerar com cuidado a questão dos princípios faz parte do processo de respeitar meu filho. Este é o ponto que revela a visão maior que devemos ter quando falamos de respeito. Princípios são as leis universais, inegociáveis e imutáveis que devem funcionar como nossa bússola interna. Orientado por eles conseguimos verdadeiramente discernir entre certo e errado e viver uma ética profunda e profícua. Quando me oriento por princípios sólidos, como Deus deseja que eu faça, é quando estou em melhor condição para respeitar aos outros. Pais orientados por princípios não respeitam seus filhos apenas por norma e condicionamento, mas por fé e amor, oferecendo a eles um respeito maduro, centrado em uma proficiente filosofia de vida que garante pleno desenvolvimento de suas potencialidades. Em suma, quem não é respeitado de forma verdadeira (por princípio), terá imensa dificuldade em crescer, em se desenvolver, em se respeitar e, consequentemente, respeitar aos outros. Não quero isso para meu filho, por isso eu luto para respeitá-lo profundamente.

7.       Respeitar educando e ensinando. É um ponto ativo, já que nossos filhos precisam ser orientados e apresentados aos princípios. Eles precisam aprender a identificar estes princípios, e também devem ser iniciados na disciplina do respeito: devem aprender a respeitar na prática. Isso é um processo, então pode começar de forma procedimental, demonstrado nos pequenos gestos, no aprender a falar baixo em certos ambientes, no cumprimento cortês, muitas vezes ensaiado, nas palavras de agradecimento esperadas em retribuição a uma gentileza, até que interiorizado se torne um comportamento habitual, desejado e valorativo. Precisamos ensinar nossos filhos a escolher como agir, e não apenas a reagir. Eles precisam saber escolher e precisam aprender a entender o mundo. Faremos isso melhor através de exemplos e por preceitos sólidos. Ensinar respeito é ensinar mutualidade, conceito que hoje escapa à compreensão de nossos pequenos, mas que amanhã será um dos maiores recursos para que sejam felizes e plenos. Eles respeitarão e cobrarão o devido respeito de forma firme e educada porque foram educados por pais respeitosos. Desejo viver esta realidade, e você?

8.       Cuidar das intenções e inclinações. Eu as tenho em uma medida e meu filho em outra. E lidar com a intencionalidade é algo melindroso. Nossas ações (ou o resultado delas) nem sempre afirmam a intenção que as motivou. Já sabemos bem o que dizem por aí sobre as boas intenções... Mas, por outro lado, é muito importante trabalhar bem a questão da intencionalidade em relação aos filhos. Quando julgamos conhecer as intenções do outro podemos errar grandemente. Nenhum pai deveria pensar que o filho erra e cria algum tipo de situação problemática com a intenção de fazê-lo. Não quero e não vou pensar que meu filho está fatalmente inclinado a ser desobediente, arrogante, irresponsável... Claro que errar sem a intenção não minimiza o erro e nem atenua as consequências, mas entender que muitos erros acontecem por inexperiência, por falta de orientação ou mesmo por pouca consideração das consequências (que é normal nos mais jovens) ajuda a trabalhar a correção e o aprendizado que os erros trazem com uma mente mais aberta e um coração mais tranquilo. Tenho procurado afirmar a meu filho seu caráter positivo e suas melhores características enquanto o corrijo em seus erros e desmandos. Quando ele me desobedece não digo “Puxa, como você é desobediente.”, como quem vaticina que ser desobediente é seu destino, pois é essencialmente o que ele é. Ao contrário, digo que aquela ação me entristece e desagrada, e que não combina com ele, justamente por ele ser um garoto bom e obediente. Tenho entendido que atribuir a ele uma intencionalidade e uma inclinação prévia para a desobediência ou para o mal, e julgá-lo sem ouvi-lo é um ato de desrespeito que não quero cometer enquanto pai apaixonado...

9.       Considerar o tempo atual (momento do tempo em que vivemos) e sua diferença gritante com o passado é essencial para que exista respeito verdadeiro entre as gerações. A época em que meu filho vive traz consigo uma cultura (jeito de vestir, fazer, conhecer e sentir) e uma visão de mundo que lhe fornecerão percepções bem diferentes das que eu tive quando tinha a idade dele. Isso implica em que, por muitas vezes, aquilo que me encantava enquanto menino (brinquedos, atividades, lugares, histórias...), pode não ter efeito semelhante sobre ele hoje. Ficar dizendo “no meu tempo” e tentando fazer com que meu filho sinta e viva da mesma forma, representa não só uma incapacidade de me conectar integralmente com o momento atual, como também um desrespeito ao fato de que meu filho é um ser do presente, com uma verdade presente, mais ampla e mais completa do que aquela que me servia de orientação. Sou eu quem precisa de ajuste com o tempo de hoje, e não ele quem deve ser ajustar com o tempo de ontem. Uma coisa é aprender com as lições do passado e com a história (e transmitir isso aos filhos) outra coisa é viver no passado, em desajuste com o contexto. Assim, (vivendo no presente) todos os muitos anos de minha vivência podem ser um fator de auxilio no meu relacionamento de pai e educador, que tem experiência de vida, me fazendo respeitar meu filho. Caso contrário, viverei em conflito por insistir em viver em um tempo que já não existe mais. Preciso respeitar meu filho no tempo em que ele vive, sem medo das mudanças, pois estaremos ancorados na solidez dos princípios.

10.   Respeitar embasado no AMOR (expressar amor com respeito e demonstrar respeito com amor) será um ato que trará muita satisfação e muito aprendizado. Com base nisto meu filho aprenderá a viver uma troca saudável, entre ele e os outros, de admiração, cortesia, amabilidade e proteção.  Sendo respeitado em amor meu filho aprenderá a praticar a mutualidade. Fazendo isso, ele estará cumprindo a regra de ouro que Jesus ensinou no sermão do monte (Mateus 7:12), algo tão sublime e necessário à vida plena e alegria. A regra de ouro é um tesouro conhecido e reconhecido por todas as religiões e filosofias de vida plena, e é resultado direto e ao mesmo tempo ação prática do RESPEITO. É assim que quero respeitar (e ensinar) meu filho.

Resiliência e respeito próprio. Se eu não respeito meu filho desde sua mais tenra infância ele pode acabar não respeitando a si mesmo. Se algum pai não praticou o respeito desta forma, precisa recuperar seu respeito próprio e devolver aos filhos todo o respeito que eles sempre mereceram...
E já que falei em merecer, devo dizer que não sei se concordo plenamente (ou se concordo de alguma forma) com a ideia de que meu filho deve conquistar meu respeito. Penso que nascemos merecendo respeito. Assim, entendo que meu filho não precisa conquistar nada. Como pai, eu devo respeitá-lo. O amor que sinto por ele já deve garantir a meu filho todo o meu respeito. Visto desta forma, respeitar é uma escolha consciente que faço e uma atitude firme que devo seguir ao agir, ao me relacionar e ao educar meu filho. Ser respeitado desde cedo ajuda a pessoa a escolher agir na mesma base em relação a todos os seus relacionamentos, tornando-os mais ricos. Então, meu filho não conquista meu respeito, mas suas ações, quando respeitado e estimulado, conquistarão, a cada dia, minha admiração e ampliarão ainda mais o respeito que decidi dar a ele.

Quando entendi que Deus entregou Jesus em uma cruz para que eu pudesse ser salvo, mas mesmo diante de um sacrifício tão grande e intenso, me permitiu aceitar ou não sua ação em meu favor, descobri um amor incompreensível, e pude perceber como este Deus maravilhoso me respeita, apesar de minha imperfeição. Como pai apaixonado, decidi respeitar meu filho nesta mesma base, tentando imitar ao máximo a sublimidade do amor de Deus por mim. Convido você a fazer o mesmo. Pense nisto.